Quando os testes eram no Estoril !
Desde meados de 1997, quando o Autódromo do Estoril fechou para obras para ser alvo de uma profunda remodelação na configuração da pista em nome da segurança, para poder continuar a receber o Grande Prémio de Portugal de Fórmula 1 (F1) que albergava ininterruptamente desde 1984, que as equipas de F1 deixaram de utilizar o mais antigo circuito português permanente como palco favorito de testes, salvo uns regressos fugazes de Williams, Benetton e Prost no início da década passada. (https://arquivos.rtp.pt/conteudos/automobilismo-testes-de-f1-no-estoril/)
Depois, devido ao chumbo do Tribunal de Contas, por politiquice, ganância, lóbis, interesses pessoais e afins, as obras não ficaram prontas a tempo do Grande Prémio de 1997, bem como o de 1998, tendo depois destes tristes acontecimentos a FIA e sobretudo Bernie Ecclestone , o então patrão da FOM (Formula One Management), perdido de vez a paciência e acabou-se o Grande Prémio, até hoje.
Até 1997 ( https://youtu.be/CdJ_ODZvyro), o que Jerez e sobretudo Barcelona têm sido para as equipas de F1, os seus circuitos preferenciais e oficiais dos testes, era o Autódromo do Estoril.
Dizia-se que um carro que fosse rápido no Estoril era rápido em todo o lado. Era uma pista que tinha de tudo, curvas lentas, médias, rápidas (https://www.youtube.com/watch?v=yIVE1vRqtzY), condições climatéricas favoráveis, sobretudo no Inverno.
Era comum os fãs da F1 poderem no defeso irem ao Estoril ver as suas equipas e pilotos favoritos testarem, muitas vezes o acesso às bancadas, sobretudo as Bancadas A e B (as da reta da meta) e a H (a da Parabólica Exterior como era conhecida na altura e desde 1994 Parabólica Ayrton Senna) eram livres.
O circuito era diferente da actual versão, as curvas 1 e 2 eram bastante mais rápidas, os pilotos após a curva da Orelha continuavam a subir até fazerem a curva do Tanque, os Esses também eram diferentes, bem como a Parabólica Ayrton Senna, mais rápida que hoje em dia(https://www.youtube.com/watch?v=yIVE1vRqtzY).
Mas a segurança era também menor, a escapatória da Curva 2 não existia quase, no Tanque idem, a da Parabólica Ayrton Senna também era muito reduzida face à velocidade que os F1 percorriam aquela curva, lembro-me de à minha frente assistir ao acidente de Mika Hakkinen (https://www.youtube.com/watch?v=7R8wWvBnyjQ) na estreia pela McLaren em 1993, corrida em que se não fosse esse acidente poderia ter ganho.
Também assisti ao vivo a uma das melhores ultrapassagens de sempre na F1 e incrivelmente
pouco mencionada, a de Jacques Villeneuve em Williams a Michael Schumacher de
Ferrari, por FORA na Parabólica. (https://www.youtube.com/watch?v=Mp37Rl2J_fg)
Apresentações dos novos carros (https://www.youtube.com/watch?v=DImf3UWbJwQ),
testes infindáveis, semanas inteiras de acção, eram um clássico no Autódromo (https://youtu.be/RqhSJ1oYUWM ). Tal como hoje em dia as equipas conhecem todos os detalhes do circuito de Barcelona-Catalunya de trás para a frente, o mesmo sucedia com o circuito do Estoril.
Eram tempos tão intensos de F1 em Portugal, que já era uma
coisa banal para quem morava na zona, ouvir o brutal ronco dos V8, V10 e V12 da época.
Recordo-me de numa sessão de testes da pré época de 1996 (https://www.youtube.com/watch?v=WYpEDbXoxyQ&pbjreload=10 e https://www.youtube.com/watch?v=WYpEDbXoxyQ ), eu e um amigo termos perguntado à senhora que geria o bar por
baixo da Bancada A se conseguia meter-nos nas boxes. Ela falou com o segurança
do túnel de acesso ao Paddock e lá entrámos, com a maior excitação,
emoção e incredulidade que dois adolescentes apaixonados por F1 sentiam.
Estivemos ao lado de muitos pilotos, conversámos tranquilamente com o Mika Hakkinen, na altura ainda a recuperar do seu terrível acidente em Adelaide em 1995, com o David Coulthard, vimos um jovem Jan Magnussen (pai de… Kevin Magnussen, actual piloto da Haas F1 ) a passear pelo paddock, ficamos pasmados ao ver a passar à nossa frente o então “apenas” bicampeão do mundo de F1, Michael Schumacher, nas suas primeiras voltas no monolugar da Ferrari e com o seu novo motor V10, (https://www.youtube.com/watch?v=GHHsZrTNgsk&t=64s). Acabado de chegar ao Cavallino Rampante, Schummy era claramente o piloto com mais aparato dos media nesse dia.
Mas tudo isto era o padrão, as equipas de F1 virem ao Estoril para testar. Jacques Villeneuve por exemplo, na sua preparação para a estreia no Campeonato do Mundo de 1996, passou boa parte de 1995 e na pré época de 1996 a testar exaustivamente no Autódromo. Até disse na altura que a pista portuguesa era maravilhosa até se chegar à chicane ou variante, que ele
detestava.
Chicane, que ao contrário do que muitos acham, não foi criada
em nome da segurança após os acidentes mortais de Ayrton Senna e Roland Ratzenberger
em 1994, mas sim no ano anterior para as provas de motociclismo internacional,
sendo depois a partir de 1994 e até hoje utilizada obrigatoriamente pelas
motas, mas também pela maioria de corridas de automóveis, salvo poucas excepções
em que é utilizada a espectacular, desafiante, rápida, “cega”, mas de facto
perigosa curva do Tanque. Insegura, porque a mesma não tem praticamente escapatória, nem
pode ser construída nenhuma devido aos limites do terreno onde está inserido o
Autódromo.
Foram maravilhosos tempos, em que tínhamos a F1 no
Autódromo do Estoril quase o ano todo, para além obviamente do Grande Prémio,
quase sempre no penúltimo fim de semana de Setembro, tirando a edição de 1984,
a que deu o terceiro e último título a Niki Lauda e que foi em Outubro e a de
1985, que aconteceu em Abril ( e literalmente “águas mil”) que teve como
vencedor pela primeira vez na sua gloriosa carreira Ayrton Senna, no seu lindo
John Player Special Lotus. ).
Esperemos que um dia a F1 regresse a Portugal, nem que seja
só para testes, sejam eles no Estoril ou em Portimão (que recebeu testes
oficiais em 2009). Mas se o regresso incluísse também o Grande Prémio, era um
sonho tornado(novamente) realidade.
Ui que memórias!
Estar em casa, em S. João do Estoril e ouvir o ronco dos carros no autódromo! impressionante.
Lembro-me perfeitamente de ser um putozinho e ter ido ver um grande prémio, estar na bancada central e o meu pai tapar-me os ouvidos com o casaco, porque na recta o som era insurdecedor! Bons tempos…
Deixa-me triste, que, por causa de interesses e palhaçadas, tenhamos perdido uma das melhores competições para se ver ao vivo!
Óptimo Post!
Eram de factos tempos maravilhosos, eu tive a sorte e ir ver o GP de 1986 a 1996, para além dos testes.
E sim, perdemos estupidamente a F1.
Obrigado pelo elogio !
Francisco, excelente artigo!
Ainda esta semana comentei com amigos das memórias que tenho de ser puto e ir com o meu Pai ver os testes de F1 na bancada A.
Ainda tenho aquele som na cabeça: vrrruuuuuuuummmmmmmmmmmm
Obrigado pelos vídeos.
É um grande prazer ler os teus textos e ouvir te no podcast.
Continua!